quarta-feira, 29 de fevereiro de 2012

O Homem Infeliz.

Palavras soltas, onomatopéicas, fortes, estridentes. Eram faladas mas não eram ouvidas. Eram ditas por dentro. Algo esquizofrênico, paranôide, louco. Como lesmas, caminhavam pelo corpo. Por onde passavam provocavam dor, machucavam, cortavam, feriam. Fazia todo o caminho de tortura e terminavam na cabeça onde irrompiam em insuportável dor. O homem chorava, tomava café, fumava cigarro, olhava o orelhão azul que ficava na esquina de sua casa. Todos os vizinhos dormiam. Com certeza eram casados, com filhos, uma rotina estressante de trabalho, jantavam todos juntos assistindo a novela das 8, colocavam as crianças para dormir, fodiam a noite bem rápido para não acorda-las, terminavam a transa com um beijo e dormiam. O Homem era infeliz. As palavras soltas não o deixam dormir. Levantava da cama, deitava no chão, levantava do chão, bebia café, fumava cigarro, comia amendoim, olhava o orelhão azul que havia na esquina da sua casa. Ao lado do orelhão agora tinha uma mulher, cabelos pretos, salto alto, bolsa pequena nas mãos, vestido tão curto que poucos saberiam se era vestido ou blusa, calcinha enfiada no rego e de batom vermelho sorria. Caminhava como uma modelo na passarela. Sorria para ninguém, acenava para os carros que buzinavam, cheia de sí nem parecia meretriz. O homem pensou o quão infeliz era sua vida e aquela meretriz era um escárnio sobre sua mazela. Pensava em como pode ela sorrir e ele tomando seu oitavo café e fumando o ultimo cigarro de seu maço. Assim que aquela afronta lhe passou por debaixo da janela, o homem gritou
-MERETRIZ. Sai da rua meretriz. Respirou fundo, sentiu-se vingado.

A mulher suspendeu mais o vestido e num espetáculo de movimentos corpóreos, dava tapas em sua vagina e gritava :

- Não sou metriz, SOU PUTA. Entenda seu filho da puta. PUTA SEMPRE VAI SER PUTA, VIADO SEMPRE VAI SER VIADO E CORNO SEMPRE VAI SER CORNO.
Abaixou o vestido e continuou seu caminho. O homem continuou infeliz, porém depois daquela cena, as palavras torturadoras calaram-se, apagou o cigarro, deu a ultima golada no café, desligou as luzes e dormiu.

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